segunda-feira, 21 de novembro de 2011

BOTINADA

O grande desbravador brasileiro, Bernardo Sayão, deixou como um dos seus legados, o surgimento de vários vilarejos ao longo de sua grande obra, que foi a construção da rodovia Belém-Brasília. Estrada que fez a ligação entre o norte e o sul do país. Dentre essas vilas está a cidade de Miranorte.

O município teve seu primeiro impulso de crescimento nos anos 70, com a pavimentação asfáltica da estrada. A BR 153 trouxe desenvolvimento em todos os sentidos para a região. Lembro-me de uma grande novidade da época. A prótese dentária que naquele tempo era chamada de “ponte”. O esporte também acompanhou a evolução. No futebol a cidade sempre revelou grandes craques. A cada geração novos talentos surgiram para defender as cores da camisa miranortense. Naquele tempo as famílias eram tradicionalmente numerosas por isso algumas delas formavam sozinhas equipes de futebol. Seu Sinato (in memória) e D. Florência capricharam na produção. Tiveram 7 filhos. 2 mulheres e 5 homens que nasceram com o dom de jogar futebol. Pedro Pereira de Souza o mais velho, conhecido como “Pedro Sardão”, era zagueiro, chegou a jogar no Anápolis e quando criou o Estado do Tocantins, defendeu a seleção tocantinense tendo inclusive o privilégio de jogar contra a seleção brasileira de novos que trazia no elenco nomes como Túlio, Cafu, Márcio Santos e Marcelinho Carioca. Gérsom, Wéliton e Wilton tiveram passagens discretas pelo futebol. Já José Pereira, mais conhecido como “Zé Véio” era o mais habilidoso sua caminhada futebolística foi marcada por belas jogadas, muitos gols, e boas histórias. Depois de muitos quilômetros de grama e muitas horas de bola rolando, “Zé Véio” protagonizou mais essa pérola. Nos anos 90 já na categoria máster, Miranorte e Paraíso entraram em campo pelo Campeonato Estadual. Como sempre jogo duro de muita rivalidade. “Zé Véio” com toda sua habilidade começou a infernizar a zaga adversária que só tinha como alternativa a falta. Numa dessas jogadas ele saiu fazendo fila. Seu marcador já irritado não contou conversa e “chegou a botina”. Falta dura que quase quebra a perna do atleta. Depois do jogo, na comemoração da vitória regada a “loira gelada”, ele chamou o Euzimar de lado e mostrando a “ponte” falou:

- Olha! Euzimar o que os “caras” fizeram comigo... Quebraram meus dentes.

O Euzimar vendo o estrago questionou:

- Ué! Eu não lembro dessa jogada!...

E veio a explicação.

- Foi na hora do pontapé que ele me deu!

O Euzimar continuou.

- Do pontapé eu me lembro, mas acertou na boca?...

Zé Véio justificou.

- Não! Rapaz, é que antes do jogo começar eu guardo a ponte dentro do meião pra não cair e perder. Aí ele chutou bem em cima e quebrou!...

José Pereira de Souza, nosso querido “ Zé Véio” continua batendo um bolão. A cada fim de ano no encontro de Bahia e Flamenguinho pelo jogo da saudade, ele geralmente deixa sua marca. VALEU MEU IRMÃO!


sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Carimbó nunca mais


Nos anos de 1976 a 1978, a cidade de Miranorte vivia um grande momento no futebol, com um time de garotos chamado “Bahia”. Eram muitas competições envolvendo equipes tradicionais como Paraíso, Miracema, Gurupí e Araguaina. O que mais chamava a atenção, é que esses garotos sempre enfrentavam equipes de jogadores adultos e acabavam vencendo. E a fama foi se espalhando pela região.

Certa vez um grande desportista de nome José Alvino, do longínquo município de Lizarda, nos convidou para abrilhantar os festejos da cidade com uma partida de futebol. Naquele tempo as estradas pelo então norte goiano, era como fantasma. A gente ouvia falar, mas não existiam.

Nós saímos de Miranorte num sábado à tarde para jogar no domingo. Éramos 14 garotos em uma caminhonete da prefeitura. A viagem até a cidade de Rio Sono foi normal com estrada cascalhada e tudo. Só que na beira do rio veio a primeira dificuldade. A balsa que era ligada a um cabo de aço, só atravessava durante o dia. Aí o jeito foi esperar o amigo sol aparecer. Dia novo, tarefa cumprida, sem tomar café seguimos viagem e logo as coisas se complicaram. Um verdadeiro deserto apareceu na nossa frente o areal mais parecia as dunas do jalapão do que uma estrada. Nosso transporte ficava mais atolado de que andando e, o dia foi passando na base do desce para empurrar, sobe para viajar.

Depois de muita areia na cara, enfim chegamos faltando uma hora para o jogo. Estávamos caindo de fome mas não tínhamos tempo para comer. Fizemos um breve lanche e fomos para o jogo. Toda a população estava no campo, fazendo uma grande festa. Aos trancos e barrancos nossa equipe conseguiu arrancar um empate em dois a dois. Após a partida os Lizardenses, muito hospitaleiros, resolveram fazer um baile para nós. Nos reunimos em um salão para a festa. O som era de uma “radiola”. Daquelas em que a caixa de som era a própria tampa do aparelho. As músicas do auge era o carimbó estrelado pelo artista paraense Pinduca. O som rolando, cervejas geladas, todo mundo na maior animação com a presença das meninas, tudo como boleiro gosta. Só que as personagens principais da festa, as candidatas à rainha do festejo, foram logo tratando de aumentar o único quesito para a eleição. Que se resumia na maior quantidade de dinheiro arrecadado.

A brincadeira era simples, cada vez que elas dançavam com alguém, a pessoa tinha que pagar. O problema foi que ninguém da nossa turma sabia dessa tradição local. Como em toda equipe tem “uns caras” metidos a galã, nossos bonitões; Índio, Pereira, Almeida e Zé Ribeiro, caíram na folia e as meninas só anotando as danças. Lá pelas tantas da madrugada, as candidatas resolveram passar a régua e fechar a conta. Quando os "pés-de-valsa" ficaram sabendo que deviam mais de 30 mangos, cada um, foi um Deus nos acuda. Pois dos quatro, apenas o Zé Ribeiro trabalhava e tinha seu rico dinheirinho. O jeito, então, foi assumir a dívida por livre e espontânea pressão.

Fim de festa, volta pra casa, com direito a quebra do transporte em Pedro Afonso, fome e tudo mais. Mas ninguém voltava tão contrariado quanto nosso amigo pagador de contas. Pois ele sabia que daquela grana supostamente emprestada ele não teria muito sucesso com um possível retorno ao seu bolso. O tempo passou e eu só não fiquei sabendo, se alguém chegou a pagar o empréstimo. Mas dizem que até hoje nosso amigo não vai a festejo pra não ver candidatas a rainha. E se quiser comprar uma briga é só rodar uma música de carimbó perto dele.

Mas depois de algumas décadas, com certeza essa história deve servir para boas gargalhadas quando esses amigos se encontram. Afinal são essas e outras que fazem a vida ser um poço de boas recordações...


sexta-feira, 18 de março de 2011

Futebol na Aldeia

Quando Cabral chegou ao Brasil, encontrou indios. Logo, os nativos são os primeiros habitantes desse grande país tropical. Por isso em qualquer canto de nossa pátria amada, é comum se ouvir histórias da nação indígena. No Tocantins não seria diferente, principalmente pela contidade de etinias que vivem por aqui. E o futebol também tem sua página escrita na história.


No início da década de 80 um grande desportista de nome Antônio, mas conhecido como Toinho da Funai, em suas tarefas junto à nação indígena xerente, resolveu introduzir o futebol nas atividades realizadas com os indios. Construiu um campo na aldeia Porteira perto da cidade de Tocantínia, e começou a ensinar o bom joguinho para os nativos. A novidade fez sucesso e a cada fim de semana, índios de todas as aldeias se reuniam para uma boa “pelada”. Nesta brincadeira até surgiram grandes talentos, o mais conhecido foi o meia atacante Antônio Carlos que chegou a jogar no MEC-Miracema Esporte Clube.

Empolgado com a rápida evolução dos índios, o idealizador do projeto “Futebol na Aldeia”, resolveu testar as habilidades de seus atletas e o poder da equipe. Chamou o time de Miracema para uma partida amistosa na própria aldeia. Meio receosos aceitamos o convite e partimos para o desafio. Literalmente embarcamos rumo à reserva, já que o transporte era um barco a motor chamado de “paco-paco”. Descemos o Rio Tocantins deslumbrados com as belezas naturais que surgiam a cada momento. Depois de algumas horas de navegação chegamos ao destino. Na beira do rio toda a população da aldeia nos esperava. De longe parecia cena daqueles velhos filmes de faroeste em que o mocinho se depara com um bando de guerreiros preste a atacar.

Meio desconfiados subimos a rampa cercados pela a multidão e ouvindo eles conversar sem entender uma palavra. Sem perda de tempo fomos direto para o campo de jogo. A bola rolou e nosso time ficou encurralado, parecia que eles tinham mais de cinquenta jogadores. Quando a gente dominava a bola aparecia de três a quatro marcadores e na maior gritaria. Depois de algum tempo nessa batalha, foi que fomos perceber que eles não guardavam posições, onde a bola estava eles se amontoavam. Passamos então a ocupar os espaços vazios e tocar a bola logo os gols foram saindo. No final dos 90 minutos o placar assinalava 17 a zero.

Final do jogo fomos logo nos preparando para retornar à Miracema. Cercados por toda a nação xerente enquanto tirávamos as chuteiras para podermos embarcar, fomos surpreendidos pela chegada de um velho cacique. De borduna(arma indígena) na mão , ensaiando uns estranhos passos de dança, de repente ele parou, levantou a cabeça, olhou dentro dos olhos de cada um, suspirou fundo e com um bom sotaque indígena mandou seu comentário sobre o jogo.

  • Jogô só um pouquim e foi esse tanto de gôlo, se jogá o dia todo vai ser mais de mile...eh! eh! eh!...

    Na hora caímos na gargalhada com ele, mas não entendemos nada. Só depois descobrimos porque ele teceu este comentário. É que o costume deles era começar a jogar de manhã, só parar para almoçar e voltava pra pelada até escurecer. O pior é que na maioria das vezes o placar não saía do zero a zero.

    Mas o projeto do nosso amigo Toinho, valeu a pena. No final da década a equipe chegou a jogar no Estádio Serra Dourada em Goiânia, contra a equipe escrete de ouro dos cronistas esportivos de Goiás. E com a criação do Estado do Tocantins e a profissionalização do futebol, é comum ver um índio disputando o Campeonato Tocantinense de Futebol.