sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Boleiro Nativo

Para contar as “histórias que eu vivi”, busco os meus amigos de infância como personagens...são fatos ocorridos nos bastidores do dia a dia do esporte, durante três décadas. Mas eu também sou personagem de algumas passagens negras na minha carreira futebolísticas. E não seria justo eu omitir as minhas mancadas. Por isso, vamos partir do princípio.

A minha caminhada esportiva começou em Miranorte, no ano de 1974. meu primeiro campo foi um curral da prefeitura, local usado para prender os animais que transitavam livrementes pelo centro da cidade. Nós usávamos as porteiras como traves e fazíamos os rachões. A bola só saía quando era gol, como o showbol de hoje. Certo dia numa boa pelada, eu fui descoberto pelo professor Antônio Ubiratã. Levado para a equipe juvenil da cidade, veio meu primeiro desafio. Um Jogo de verdade, em um campo de verdade, contra um time de verdade.

    A partida era contra o time de Dois Irmãos, numa preliminar das equipes principais. Na hora de vestir o uniforme surgiu um contra tempo. Eu não tinha chuteiras. Aliás, eu nunca tinha chutado uma bola calçado em alguma coisa. Mas o professor Ubiratã foi logo resolvendo o problema, tirou os tênis, me emprestou e desafiou:

    -Se você marcar dois gols, eu te dou um par de chuteiras!...

    Calcei os tênis que era dois números a mais e fui pro jogo. Vencemos a partida de goleada, seis a zero. Eu marquei o primeiro e o último gol.

Promessa feita e cumprida, na segunda feira eu estava com meu primeiro par de chuteiras nas mãos. Só não sabia o que me aguardava. No final de semana seguinte veio a hora de inaugurar o presente. O jogo foi em Colinas, eu todo empolgado, de chuteiras novas, louco pra entrar em campo. Ainda me lembro que era um campo de areia em frente ao Colégio João XXIII.

Bola em jogo e começou o meu martírio. As chuteiras me deixou “peado”, não conseguia correr, quando a bola chegava eu não conseguia dominá-la e os chutes só pegavam na “orelha”. A coisa estava tão feia que a torcida começou a gritar?

  • Bate nele bola...bate nele bola...

A única jogada que conseguir fazer foi pela direita, onde ganhei do lateral fui à linha de fundo. Mas na hora de cruzar na área, o pé esquerdo tocou primeiro na bola e o chute passou no vazio...uma senhora “furada” acompanhada de um senhor tombo. Ali mesmo sentado tirei as chuteiras, os meiões, joguei pro lado e levantei pra continuar no jogo. Mas o árbitro não permitiu que eu jogasse descalço...resultado, fui sacado do time.

O tempo passou, aprendi a jogar calçado e comecei a me destacar dentro das quatro linhas.

Em 1979 mudei para Miracema, já era conhecido e fui logo convidado para jogar no juvenil do MEC(Miracema Esporte Clube) na equipe chamada de Escolinha Esporte Clube. A minha estreia foi em Porto Nacional, no estádio General Sampaio.(único campo gramado do então, norte goiano) Era um torneio comemorativo à inauguração da ponte sobre o Rio Tocantins. Nós saímos de Miracema na madrugada em cima de um caminhão da prefeitura, pela rodovia onde hoje é a TO-050. Depois de 32 pontes e muita poeira, chegamos à Praça do Centenário. Lavamos o rosto alí mesmo nas torneiras do jardim e seguimos para o local do evento. Festa grande com churrasco público “gente saindo pela culatra”. No meio de tanta agitação e atraído pela beleza da ponte, me afastei do grupo e me perdi. O torneio estava marcado para começar às 14 horas. Já era meio dia e eu ainda procurando a turma. Sem encontrar os companheiros, a solução foi puxar no pé da ponte até o estádio, cerca de 10 quilômetros. Quando cheguei ao campo todo mundo já estava uniformizado. Eu com os pés ardendo e cheios de bolhas, mesmo assim fui pro jogo. Foi um desastre, comecei a correr as bolhas estouraram. Daí em diante não conseguir me achar em campo, ou melhor, parecia que nem tinha entrado nele. "Resumo da ópera", minha estreia foi um fiasco, Para decepção da equipe que contava comigo como grande reforço. Saí no intervalo da partida e o time melhorou. Vencemos o primeiro jogo e empatamos o segundo, ficando com o troféu. Depois do jogo vieram os comentários...O primeiro questionamento me pegou de surpresa. O goleiro e meio dono do time, Beltrão Filho, virou pra mim e perguntou:

  • Elcio...o que aconteceu que você não viu a cor da bola?...

Eu sem ter o que responder fui logo botando a culpa em alguém.

  • Sei lá,...acho que foi o gramado, eu só sei jogar em campo de terra!...

As gozações duraram anos...e de vez em quando alguém ainda tira um sarrinho do tipo:

  • Elcio,...você já aprendeu a jogar em campo gramado?...

Mas isso é o simbolo da amizade que o grupo tinha e que ficou para sempre.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Salve-se quem puder...


Cidades vizinhas sempre cultivam uma tradicional rivalidade, principalmente no esporte. Neste assunto, na década de oitenta, Miracema e Miranorte eram como cão e gato. Cada encontro terminava em mordidas e arranhões. Esta história seria cômica se não fosse drástica...Mas como dizia o poeta, "entre mortos e feridos salvaram-se todos"...


Naquele tempo a maior diversão nos finais de semana eram as competições esportivas. Os torneios regionais eram frequentes em várias modalidades, mas o carro chefe sempre foi o velho e bom futebol de campo.

Em um desses torneios o clássico “Mira-Mira” (Miracema x Miranorte), aconteceu na fase semifinal. A primeira partida foi no Estádio Castanheirão em Miracema. Um jogo para nunca ser esquecido, afinal nesses encontros os jogadores literalmente “davam o sangue” pela a equipe. Para confirmar a frase e manter a tradição, quase no fim da partida a confusão foi formada. Briga geral em campo e no meio do tumulto o atleta de Miranorte Cândido (hoje presidente de clube na Capital Tocantinense) levou a pior, saiu com um senhor corte no supercílio. O atacante do Miracema, Rosacild, foi o autor da façanha, mas eu que estava no meio da "muvuca", na turma do deixa disso, levei a culpa. Fator que me impediu de participar do jogo de volta.

No segundo encontro em Miranorte foi uma verdadeira guerra, toda a cidade se preparou para bater nos jogadores de Miracema. A segurança era pouca não dava para controlar a fúria da torcida. Assim, quando o time chegou em cima do tradicional caminhão da prefeitura, foi cercado pela multidão. O primeiro a descer foi o lateral esquerdo Sávio e foi logo levando um pescoção. Com muita conversa e ajuda de alguns desportistas locais os ânimos se acalmaram.

A bola rolou para noventa minutos de muita catimba e ameaças dentro de campo. O resultado do jogo provocou uma decisão por pênaltis, para desespero geral de nossa equipe. Na época o campo era de terra, sem alambrado, a torcida invadiu e formou um cone perto da área, para ver as cobranças. A disputa começou e cada atleta nosso, batia o pênalti e corria para cima do caminhão. A última cobrança, da série, empataria a partida e provocaria cobranças alternadas. O responsável pela tarefa era o Rosacild, o mesmo que havia nocauteado o nosso amigo Cândido no jogo de ida. Quando ele pegou a bola a torcida começou a cantar em coro.

-“Se fizer vai apanhar...se fizer vai apanhar...se fizer vai apanhar...

Nosso atleta se preparou, tomou muita distância, correu e mandou uma bomba que passou a quase cinco metros a cima da trave...Festa para a torcida e pro time local que se classificou para a final do torneio...O nosso atleta também saiu contente, pois perdeu a classificação mas salvou a pele. Já de volta para Miracema em meio aos comentários sobre a partida, o técnico Dorabel de Souza perguntou”.

- Rosacild o que aconteceu ali, na hora do pênalti?

A explicação veio imediata...

- Dorabel... eu nunca tinha visto tanta gente mal encarada olhando pra mim, com tanto ódio!... Será que eu sou tão feio assim?...

Essa rivalidade durou muito tempo...Os jogos estudantis era como se fosse encontros marcados a cada ano. Só que os combates se limitaram apenas aos resultados limpos conquistados dentro das quatro linhas. Para felicidade geral da nação desportista...