quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Colisão

Num time de futebol tem craque, tem carregador de piano, tem o cérebro da equipe e tem os dotados de um bom preparo físico. Nesta história a homenagem vai para dois ex-atletas de Miracema que deixaram suas marcas nos campos de terra do então norte goiano...


A cidade de Miracema sempre foi destaque dentro do futebol. Durante décadas as gerações de jogadores foram passando e fazendo histórias. No fim dos anos 70 e início de 80, quando minha geração fazia parte do time juvenil do MEC, na equipe principal tinha nomes conhecidos como Lázaro, Café, Canetão, Chico Louro, Moisés, Bertrand, Tião Facundes, Daví, entre outros.

Era um bom time com atletas habilidosos que faziam a diferença. E também jogadores de pura raça e força como Zé Nunes e Ezequias. O primeiro, um atacante de muita velocidade e porte físico avantajado. Seu vigor era tanto, que às vezes o campo se tornava curto e ele acabava passando da linha de fundo no maior pique. Já Ezequias, era um lateral esquerdo do tipo “madeira de dar em doido”. Daqueles que numa dividida ficava a bola ou o adversário. Não dava viagem perdida.

Certa vez um grande desportista chamado Pedro Biô, resolveu levar a equipe para fazer uma partida amistosa em Alto Parnaíba no estado do Maranhão. Três dias antes do jogo a delegação pegou a estrada via Lizarda. O transporte era um caminhão “Pau de Arara”, para poder vencer as dunas da região. Depois de muito sofrimento os aventureiros chegaram ao destino. Foi uma festa só, afinal o médio-volante do time Moisés, era o filho ilustre da cidade e tratou de organizar a recepção.

No dia seguinte o assunto nas ruas era o grande jogo. Tanto que a população resolveu ir toda para a beira do campo. Público garantido, hora do jogo. Naquele tempo não existia aquecimento coletivo e cada jogador dava o seu jeito para não entrar frio em campo. Foi então que Zé Nunes e Ezequias resolveram dar pequenos piques para aquecer os músculos. Só que os dois escolheram a mesma direção. De cabeça baixa arrancaram na maior velocidade, aí não deu outra, bateram de frente. Cada um caiu para um lado.

Depois de socorridos pelos companheiros e com um galo na testa para cada um, foram para o jogo. A torcida como sempre criativa não deu sossego. Toda vez que um dos dois pegava na bola e começava a correr a galera gritava:

  • Liga a seta!...Buzina!...Acende os faróis!...Pisa no freio...

Foi assim os noventa minutos, mas no fim tudo virou festa. O sarro da torcida se transformou em piada e rendeu muitas gargalhadas durante muitos anos.

Pois é, hoje os dois cidadãos com certeza, contam para seus netinhos essa e muitas outras histórias que o futebol proporcionou.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Esconderijo

Time pra ser bom tem que ter: craque, carregador de piano, goleador, bom goleiro, dá sorte e ter uma figura inusitada para tirar o estresse do grupo. A Escolinha Futebol Clube de Miracema tinha tudo isso. A equipe existiu nos anos 80 e muitas histórias surgiram, para alegria dos amantes de um bom "mico"...


Toda cidade tem uma figura folclórica dentro do futebol. Em Miracema são tantas que dar pra montar um time completo. Mas hoje eu vou falar apenas de uma. E que figura!... “Cícero Curió”. De família simples, Curió desde pequeno frequentou os campinhos de “pelada” espalhados pela cidade. Os mais mais famosos eram o da praça do mercado, o do pé de pequi onde tinha presença garantida do futuro atleta.

O tempo passou o menino cresceu e sua fama começou a se espalhar. Curió tinha como característica a velocidade e o único drible que aprendeu foi a “meia lua” ou “drible da vaca”; aquele que se joga a bola de um lado do adversário e pega pelo o outo. Mesmo assim ele começou a fazer sucesso e ganhou até um codinome, “Furacão da baixa preta” (apelido do setor onde morava)

Com tanta notoriedade o atleta acabou sendo convocado para integrar a equipe da Escolinha Futebol Clube, o principal time da cidade. Naquele tempo o futebol usava os tradicionais ponteiros e Curió era ponta direita nato. Sua passagem pelo futebol miracemense foi marcado por boas atuações e muitos gols hilariantes. Os mais comuns eras aqueles em que ele tentava o cruzamento e a bola acabava morrendo dentro do gol. Curió também era a diversão do grupo, sempre com tiradas históricas. Certa vez em Porto Nacional, depois de uma partida, saímos para a praça do centenário, onde existia uma boate de nome Sukata. No interior do recinto tinha uma parede toda revestida por um enorme espelho. Quando a gente entrava tinha a impressão de que o salão fosse maior. Nós estávamos sentado em um canto, quando o Curió chegou. Ele olhou e viu o grupo lá no fundo e caminhou na direção. Não deu outra, bateu de cara no espelho. Mas não perdeu a pose, para disfarçar enfiou a mão no bolso, sacou aquela famosa escovinha redonda e começou a pentear o cabelo...

Outra façanha do nosso amigo foi durante uma partida daquelas bem acirrada. Ele pegou um lateral duro na marcação, daqueles que grudava no atacante parecendo carrapato. O jogo seguia e Curió não conseguia pegar na bola. Quando ele chegava o lateral já estava fungando em seu cangote. Em uma certa parte do jogo, Carlitinho que jogava no meio, procurou o ponta e nada. Ele virou a jogada para a esquerda e foi verificar por onde andava o companheiro. Curió estava agachado em cima da linha lateral, quase se misturando com os torcedores. Sem entender nada o Carlitinho questionou:

  • O que foi Curió?...

    Ele imediatamente fez aquele gesto de silêncio (com o dedo indicador na boca) e mandou a pérola...

  • Psiu!...cala a boca se não ele me vê!...

  • O Carlitinho sem entender nada retrucou:

  • Ele quem rapaz?..

  • E veio a explicação!

  • O lateral!...eu estou escondendo dele, mas pode mandar a bola que eu apareço!...

Essa e muitas outras pérolas de nosso amigo, ficaram marcadas nas páginas da história esportiva de Miracema.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

UM CASO DE AMOR

"O celeiro do handebol". Esse era o titulo da cidade de Miracema nos anos 80. uma década marcada por uma equipe que não sabia o que era derrota. a febre pegou e foi passando de geração pra geração e claro rendendo muitas histórias pitorescas, como essa...

A cidade de Miracema e o handebol têm uma verdadeira história de amor. O romance começou no início dos anos setenta. A jovem e bela cidade às margens do Rio Tocantins, teve seu primeiro contato com a modalidade esportiva através do professor de educação física, Manoel Jardins, que em suas andanças pelos grandes centros do país, se encantou com o bom joguinho. De volta à terrinha, o professor trouxe a novidade.

Em 1975 Manoel Jardins deixou a área educacional e passou a bola para José Carlos, que deu continuidade ao trabalho no Colégio Tocantins. As dificuldades eram enormes, começando pela falta de quadra de espotes para treinar. Problema resolvido na base da "enxada e picareta", em um terreno baldio, pelo próprio professor e seus alunos.

Na hora dos treinamentos um obstáculo curioso. O terreno era muito irregular e não permitia que os atletas "quicassem" a bola. Então, as jogadas se resumiam à troca rápida de passe, fator que sempre surpreendia os adversários

Paralelamente no outro colégio da cidade, o Santa Terezinha, o professor Osneide Cavalcante, carinhosamente chamado de "Rubim", trabalhava a modalidade com seus alunos. Em 1977, a cidade sediou os primeiros jogos estudantis do então norte goiano. A competição aconteceu na quadra do Colégio Santa Terezinha, que teve o handebol como a modalidade principal. Destaque para Dulce Dias chamada na época de “fenômeno”.

Nos anos 80, Miracema assinou de vez seu casamento com a modalidade esportiva. Foi quando veio a consolidação dos jogos estudantis na cidade. Foi a era de ouro do Colégio Tocantins. Atletas como Rainel, Elcio, Salvador, Tião, João Alberto, Deinha e muitos outros, fizeram do handebol do CT, um verdadeiro time dos sonhos. Só pra se ter uma idéia essa equipe em 8 anos perdeu apenas uma partida. Foi em 1981, para a SAMA de Minaçu, nos jogos estudantis de Gurupi. O placar foi 32 a 31. chegamos bem perto da perfeição, tanto que o professor José Carlos, chegava a colocar uma equipe em cada tempo do jogo e o desafio era saber qual marcava mais gols.

O entrosamento era tão grande que as vezes acontecia fatos engraçados. Certa vez em um deses jogos, a equipe mais uma vez sobrava em quadra e durante a partida o pivô, João Alberto sempre passava perto do banco de reservas e falava alguma coisa. Mas o barulho da torcida era ensurdecedor e o professor não conseguia entender. Já pela décima vez ele irritado chegou bem perto e gritou:

  • Zé Carlos, me tira!...

    O professor assustado perguntou:

  • Mentira de quem?...

    E o enfezado atleta explicou!...

  • Esses caras não passam a bola pra mim!...

    Foi aí que fomos perceber que apesar da sonora goleada, o nosso inusitado pivô quase não participava das jogadas. Sem pegar na bola ele achou melhor pedir pra sair...

    A convivência de Miracema com o handebol continua em alta até hoje. Em cada competição estadual, o nome da terrinha está sempre aparecendo entre os primeiro colocados. Pelo visto ainda vem muitos pódios por ai...


segunda-feira, 14 de setembro de 2009

ANO BOM

A cidade de Miracema sempre foi destaque no esporte, principalmente no futebol. Isso rendeu muitas histórias mirabulantes como esta. Que ficou marcada na vida de cada atleta da época.


O ano de 1980 ficou marcado na história de Miracema. Foi o ano em que o Colégio Tocantins sediou um dos melhores jogos estudantis do norte goiano, dando início a uma década gloriosa do evento.

Já no futebol aconteceu um fato histórico. Através do “guerreiro da bola”, Dorabel de Souza, a cidade que tinha sofrido com uma enorme enchente do Rio Tocantins, conseguiu a façanha de trazer para uma partida amistosa, o Vila Nova de Goiânia, na época tetracampeão estadual. O jogo foi em um campo de grama nativa cercado de palha de babaçu. O resultado do jogo foi 3 a 1 para o Vila que tinha no elenco, Roberto Oliveira e Luiz Dário(Ambos técnico de futebol hoje) mas a partida serviu de ponte para o evento mais importante do ano.

Através do superintendente da Federação Goiana de Futebol, Jair Lima, nós fomos convidados a ir a Goiânia, colocar faixa de campeão no juniores do Vila Nova. A viagem foi uma aventura só. Recheada de fatos pitorescos. Começando pelo transporte que foi em ônibus da linha comercial e cada um pagou a sua passagem, levando na mão o endereço de amigo ou parente para descolar uma hospedagenzinha. Teve gente que foi carregado de encomendas. O zagueiro Pedro Nilson, para agradar os irmãos que moravam na capital, levou uma caixa cheia de mangas de várias espécies. Só que na chegada, ao descer do ônibus a caixa rasgou espalhando o produto em plena avenida Goiás e fazendo a alegria de quem passava no momento.

A maioria dos jogadores não conhecia Goiânia, outros nunca tinham saído de Miracema. Isso causou alguns transtornos. O “mico” mais comum foi pegar ônibus errado. O goleiro Edilson Pombo e o volante Chico Louro, só conseguiram chegar ao local do jogo aos 45 minutos do segundo tempo. O jogo aconteceu no dia 1º de novembro no Estádio Onésio Avarenga, campo do Vila. Nós saímos na frente no placar com um gol do volante Rainel cobrando falta, mas os donos da casa viraram para 2 a 1. Apesar da derrota fizemos uma boa apresentação, tanto que o fomos convidados para jogar no dia seguinte no Serra Dourada, contra a seleção goiana de júnior, na preliminar de Goiás e Vila Nova que decidiam o campeonato goiano.

O convite fez a equipe “tremer na base” e começou uma série de fatos engraçados. Primeiro, para jogar no Serra Dourada eram muitas as exigências e a nossa equipe teve que se adequar. Começando pelo o uniforme que nós só tínhamos 14 camisas e os reservas tinham que estar vestidos. A solução foi comprar camisas, pregar números(naquele tempo as camisas não vinham numeradas) para poder entrar no gramado. No vestiário a ficha técnica tinha que ser toda preenchida e nós só tínhamos o treinador. Então os miracemenses presentes viraram membros da diretoria. O então prefeito da cidade, Sebastião Borba, virou o presidente do clube, o médico foi o Raimundo Boi (hoje político), o massagista foi o Manoel Pires (hoje membro do TCE). O interessante é que o massagista levou a sério. Conseguiu uma bolsa oficial e foi à luta. Quando algum jogador caía, nosso massagista não perdia tempo invadia o campo no maior pique. Só que nossos atletas não estavam acostumados com a novidade e antes que ele chegasse para atendê-los, o jogador se levantava. O saldo disso era uma senhora vaia de um estádio lotado.

Em campo até que fomos bem. Os únicos que destoaram foram, o lateral esquerdo, Ezequias e o goleiro Daví. O primeiro um rapaz simples que tinha como profissão o ofício de açougueiro com uma única diferença. Ele pegava o gado para o abate “na unha”. Essa disposição física do garoto, foi prejudicial ao delicado gramado do glorioso Serra Dourada. Por onde ele passava removia todas as placas de grama. A coisa foi tão feia que o administrador do estádio chegou a implorar para o nosso técnico Dorabel de Souza dizendo:

  • Dá pra tirar aquele trator do jogo?...

    Já o goleiro Daví se impressionou com o nome de Miracema passando no placar eletrônico atrás do gol e esqueceu do jogo. Quando gritaram “olha a bola”, e ele virou para o campo a rede já estava balançando.

  • Mas o fato que marcou mesmo, foi a esperteza (entre aspas) do nosso técnico Dorabel tentando enganar o trio de arbitragem. Como aquela era a primeira e única vez daquele encontro, ele achou que os “homens de preto” não reconheceria os nossos jogadores. Assim no intervalo ele colocou o meia Bertrand no meu lugar. O detalhe é que com o mesmo uniforme. Como nós dois somos escurinhos, parecia que ia funcionar. O golpe teria dado certo se o juiz não fosse um bom fisionomista. Já com a bola preste a rolar para o segundo tempo, ele se aproximou do Bertrand, olhou direitinho e mandou o verbo.

  • Esse neguinho não estava no jogo!...

    O suspeito jogador tentando disfarçar indagou:

  • Quem?..eu?...

    E o juiz concluiu:

  • É,...você mesmo!...o outro era mais alto e tinha as “queixadas” mais largas!...

    A artimanha não colou, mas valeu a intenção. Na partida até que fomos bem, apesar de termos perdidos por 4 a 2. para a seleção goiana foi apenas mais uma partida, mas para nós foi o jogo da vida no melhor estádio do Brasil.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

"No Escuro"

Este espaço foi reservado para você que adora uma boa história. Dessas que acontecem no meio esportivo e que fica gravado para sempre nas paredes da memória de um bom desportista. Para inaugurar nosso espaço vou contar essa, que aconteceu na queridíssima cidade de Cristalândia. Espero que vocês gostem!...


NO ESCURO


Nos idos dos anos 70, e até meados de 80, aqui no então norte goiano, o futebol era inspirado na copa do mundo do México, onde o Brasil havia conquistado o tricampeonato. Campo gramado, a gente só ouvia falar pelo rádio nas transmissões dos jogos; pois a "telinha" ainda não havia chegado por essas bandas. Os campos de terra eram normais nas cidades da região. As bolas eram sempre marrom, da cor da poeira que subia durante as partidas. Em algumas cidades, hoje famosas como Paraiso e Cristalândia, não havia uma área de terra e os campos eram feitos em cima da pura pedra. Isso ajudou muitos comerciantes de material esportivo. Pois a bola só durava uma semana, e as chuteiras acabavam com três jogos.

Campeonatos eram muito difíceis de ser organizados, devido as estradas de terra muito ruins. Na época das chuvas, vinham os atoleiros e na seca o poeirão colocava em risco a vida dos desportistas. Mas algumas cidades promoviam torneios de fim de semana, chamados de quadrangular(duas equipes da cidade e duas visitantes) e sempre levava o nome de alguma celebridade local.

Era uma festa só, a começar pelas acomodações. Como não havia nenhum tipo de recurso para custear as despesas, os atletas locais hospedavam os visitantes em suas próprias casas. A escolha era feita na hora da chegada da delegação. Os anfitriões olhava o porte físico do atleta e imaginava ele na mesa do almoço. Assim os mais agigantados acabavam ficando por ultimo. Mas no final a gente acabava fazendo uma grande amizade, não só com o jogador mas com toda sua família. Há quem diga que houveram até casamento com irmãs de jogadores.

As regras desses torneios eram simples. No sábado aconteciam duas partidas e no domingo os dois vencedores decidiam o título. O juiz apitava sozinho sem bandeirinhas e era sempre uma pessoa bem conceituada na cidade. No campo só as linhas da área de jogo separavam os jogadores da torcida. As traves não tinham redes e as pessoas ficavam “coladas” no goleiro.

Em um desses torneios, na querida cidade de Cristalândia, aconteceu uma final histórica. Um dos maiores clássico do norte goiano. O confronto foi entre a Escolinha de Miracema, que trazia nomes como Tiãozinho, Rainel, Salvador...e o Atletico Clube Cristal, de Morché, Washington e Wilson. O jogo até que foi bom, apesar das inúmeras pedras de cristal que tiramos de dentro do campo enquanto jogávamos.

Aos 38 minutos do segundo tempo, a Escolinha marcou um gol. Foi o suficiente para a conceituada pessoa que estava apitando esticar o tempo. O objetivo era fazer com que os donos da casa empatassem a partida. Mas o sol foi embora e o empate não saía. Aí o Sr. Juiz resolveu dar uma mãozinha e inventou um penalti. Isso com 59 minutos de jogo. Só pra se ter uma idéia, já estava tão escuro, mas tão escuro, que o atleta Salvador se misturou com a torcida que estava atrás do gol, e quando o jogador Wilson bateu o penalti, o esperto Salvador matou a bola no peito e saiu jogando.

O nosso conceituado juiz achou que o goleiro tinha defendido e resolveu terminar o jogo. Festa total dos visitantes, regada a muita "água que passarinho não bebe" exibindo o belo troféu. E assim esse dia ficou batizado como “o dia em que a falta de uma rede e o escurinho da boca da noite, salvaram um título”.